fonte: Folha de SP

O paciente entra na Performance, uma clínica de medicina esportiva, e a primeira coisa que vê, em verde limão gritante, é uma fenda horizontal na parede cinza escuro.

“Aproxime sua mão para higienização”, diz o aviso luminoso. O paciente coloca as mãos na fenda, e isso aciona um sensor de presença que faz pingar álcool em gel. Não há recepcionista. O paciente faz check-in sozinho, aproximando seu celular de um dos totens da recepção, que registra o QR code do aplicativo da clínica.

A sala de espera tem divisórias de acrílico translúcido, também verde limão, para que as pessoas mantenham distanciamento social. Quando chega ao consultório, o paciente é atendido por trás de uma divisória transparente, que vai até o teto, e separa o paciente do médico enquanto o profissional ainda não se paramentou —é a chamada “desk shield” (escudo de escrivaninha).

A clínica Performance ainda não existe. Ela é obra da arquiteta Cynthia Garcia, sócia da BG Arquitetura, especializada em ambientes hospitalares, e faz parte da Mostra Virtual de Arquitetura para a Saúde Medplex Eixo Norte.

A mostra —disponível pelo Instagram e pelo site do Medplex Eixo Norte, complexo de saúde que promove o evento— reúne oito escritórios de arquitetura do Rio Grande do Sul especializados em ambientes médicos, que criaram diferentes clínicas virtuais adaptadas ao mundo com Covid-19. São 1.200 metros quadrados projetados seguindo as normas da Anvisa.

“O medo do coronavírus afastou as pessoas das consultas médicas e dos serviços ligados à saúde, e o objetivo era reunir arquitetos especializados para criarem ambientes onde as pessoas possam se sentir seguras”, diz Mauren Motta, diretora criativa da mostra virtual.

A ideia é que as pessoas se inspirem nas ideias dos arquitetos e as adaptem para seus ambientes. O plano é lançar uma versão com arquitetos de todo o Brasil no semestre que vem, explica Motta.

A arquiteta Cynthia Garcia, que já fez obras de adaptação para Covid-19 no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, afirma que, por causa da pandemia, os clientes estão dispostos a investir em materiais que eram mais usados em hospitais. Um exemplo é o corian, um polímero que não é poroso e, por isso, não promove o crescimento de bactérias e outros micro-organismos, e é mais fácil de limpar. Para os banheiros, ela propõe sistema de limpeza com vapor de ozônio, acionado imediatamente após o uso.

Outro recurso arquitetônico que já era usado em alas de hospitais e agora se estende para ambientes de serviços de saúde são os sistemas de ar-condicionado com “filtros absolutos” e pressão positiva.

Esse sistema é usado na clínica odontológica projetada pela arquiteta Fernanda Salvagni para a mostra virtual.

Os filtros Hepa, que têm alta eficiência na retenção de partículas, eram usados apenas em áreas como salas de cirurgia, seguindo as normas da ABNT. “Agora, na realidade da Covid-19, passa a ser discutido o uso do Hepa também em outros ambientes ligados à saúde, apesar de ele ser bem mais caro que filtros tradicionais”, diz Bruno de Rosso Ribeiro, professor de engenharia da PUC-RS.

Outra proposta é manter pressão positiva dentro das salas, por exemplo, com ajuda de mecanismos exaustores, para reduzir a entrada de ar não filtrado e potencialmente contaminado.

Algumas soluções nem requerem reforma, apenas mobiliário: como as poltronas Bubble que a arquiteta Salvagni prevê na recepção da clínica que projetou. As poltronas, criadas em 1968 pelo designer finlandês Eero Aarnio, assemelham-se a uma bolha, como diz o nome e, portanto, criam naturalmente um distanciamento entre as pessoas.

“Algumas das coisas que antes eram pedidas apenas por alguns clientes, como os totens de autoatendimento dos hospitais Moinhos de Vento, tornaram-se essenciais em tempos de Covid”, diz Camilo Lisboa Franzoi, sócio do escritório Lucia Lisboa Arquitetura Médica e Hospitalar. Ele projetou um “espaço bem-estar” para a mostra.